
Ninguém pelas ondas do mar entrando
(obra publicada - 2008)
(published book of poetry - 2008)
[Ninguém pelas ondas do mar entrando]
Ninguém pelas ondas do mar entrando
E numa solidão que só o mar sabe ter,
Entro no sonho de ser mar:
Que roça pelas praias,
Num cantar rumoroso.
Imenso e inteiro.
O Futurismo XXI
Acordar no frenesim de todas as manhãs.
Sentir ouvir todos os despertadores, analógicos ou digitais, do mundo.
Com estridência, assustado com o completo devir.
E sentir o corpo a recusar isso tudo.
E numa força de pura sobrevivência animal,
Com uma sofisticada justificação,
Levanto-me pensando no ódio frenético que isto tudo me causa.
Visto tudo o que a sociedade exige, ou quase tudo...
E todos os transportes que há no mundo, que são poucos para a minha pressa de chegar.
O carro, o autocarro, o avião, o barco,
Todos me transportam em simultaneamente para todos os lugares ilusórios.
E eis que na metrópole, todas as estradas, auto-estradas, prédios e arranha-céus, carros
Ou todos os veículos, todo o ar que nos polui e nos faz mais doentes,
Todo este acelerado stress que nos causa,
Torna-me um perfeito alienado neste mundo.
E toda esta droga pela manhã, com filas intermináveis,
Sons ruidosos e superlativamente irritantes!
Ah, e um bom pequeno-almoço para matar a ideia disto tudo!
Ah, a loucura de todas as lojas por abrir!
De todos os centros comerciais que estão a abrir!
E toda essa organização caótica, a abrir, com uma anarquia discreta!
E sinto nisso tudo toda uma grande e viva organização desorganizada!
Sinto, no momento, todo o Futurismo do século XXI!
(...)
Praia interior
Na praia interior do meu ser,
Há ondas fulgores,
Há cantos de aves espirituais,
Há rochedos fortalezas...
O dia e a noite substituem-se
Num ritmo universo.
O sal espírito,
Os gestos invisíveis,
Que se tornam marcas profundas e visíveis,
No espaço ilimitado do meu Ser.
A construção de uma história
Todo o outro que nos olha,
No mero acidente da vida,
Devolve, com o seu espelho,
Uma imagem do nosso eu.
E, cada reflexo recebido,
É-nos, não poucas vezes, estrangeiro.
(Sentimos sempre perder um pouco do nosso eu.)
E quando, de forma inédita,
Visitamos o interior de qualquer espelho:
O que encontramos é toda a arte do século XX!
Que imprime e exprime,
Que seduz e repulsa,
Que constrói, reconstrói e ou destrói,
Que acentua regras ou as subverte,
Que é concreta, abstracta ou que mistura,
Que se odeia e se ama…
E quando abandonamos o espelho,
Não abandonamos um lugar,
Mas a própria «consciência».
E quando todas as imagens,
Passadas e presentes, se sobrepõem,
Resulta dessa imagem, confusa e estranha:
Caminhos percorridos,
Sentimentos vividos,
Saudades acontecidas.
A construção de uma história.